segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Dia em que o Diabo Chorou


                        Estive a conversar com o Diabo. Simpático ele. Está um pouco acabado é verdade. Uma barriguinha ligeiramente proeminente (que ele jura não ser de cerveja, pois, segundo me relatou não bebe há 200 anos). Caninos um tanto quanto gastos. A pele vermelha já não reluz com tanta intensidade. Somente o cheiro de enxofre permanece o mesmo. Bem, mas chega de divagações, porque impressões superficiais quase nunca trazem consigo verdades.

                        Nos encontramos num bar. Seis e meia da tarde de uma sexta-feira. Um ritual quase santo para a inauguração do final de semana. Eu ainda estava engravatado. Ele de smoking e bengala como bem manda o figurino. Na mão um sem fim de “Contratos Para Adesão de Almas” e diversos folders onde-se lia “Garantia de Uma Eternidade Quente – Caldeirões Exclusivos”. Convidei-o para sentar. Parecia cansado. E estava. Pediu uma gim tônica com limão. Estranhei, mas nada questionei. Nem mesmo uma expressão de surpresa, pois em verdade seria outra análise superficial, não é mesmo?

                        A cada gole nos tornávamos mais íntimos. Chegando ao ponto de trocarmos confidências. Falei um pouco de meu “adorável” chefe, do Bragantino e da gostosa do 202 que me tirava o sossego. Ele ouviu educadamente. Se propôs visitar meu chefe, pois quanto ao meu time, o Bragantino, não havia nada a fazer, uma vez que sua situação já era (é) infernal. Agradeci no tocante ao meu chefe. Já aliviado e desejoso de retribuir a gentileza estimulei-o a desabafar, contar as dificuldades que só a vida de Diabo apresentava. 

                             Mal começou a falar, para meu espanto, o Todo Poderoso Senhor das Trevas pôs-se a chorar copiosamente. Esticando os braços alcançou-me em um abraço demorado. Uma situação bastante constrangedora, é verdade: estava eu a acalentar as mágoas do Tinhoso, em um abraço apertado, com mil olhares de expectadores maliciosos e uma gim tônica com limão sobre a mesa. Um pouco mais calmo, mas ainda entre soluços fortes, expôs sua situação, que vocês hão de concordar comigo, digna de compaixão.

                        Suas investidas infernais já não eram tão necessárias. Aquilo pelo qual o mesmo havia dedicado toda sua eternidade começava a se tornar banal. A “Família” já se tratava de uma instituição falida. Crianças em tenra idade mais que conheciam o sexo e todos os tipos de perversão. Os homens já não possuíam saúde para ser deteriorada. A corrupção alastrou-se como uma epidemia. O inferno estava super-lotado e haviam surgidas várias rebeliões pelo excesso de espíritos. Escutei até mesmo a estória de um político que havia tentado surrupiar-lhe a carteira... tudo isso, havia gerado uma certa insegurança, um medo da concorrência, uma certa futilidade em sua profissão de Capeta Profissional... Completamente entendível. Tentei animá-lo:

-          Quem sabe um dia o mundo conserta, aí você pode retomar sua vida normalmente – arrisquei.
-          Quem sabe, quem sabe... – respondeu-me com ar de descrença.

E numa explosão de enxofre, voltou ao sétimo círculo do inferno um pouco mais esperançoso. Pedi outra cerveja. Antes da primeira golada me perdi olhando para o copo em vagos pensamentos e com dois fortes remorsos: a de ter mentido sobre o mundo consertar e sobre a visita para meu chefe.

7 comentários:

  1. um pouco cômico, mas bem realista... grande abraço Thiago e olha, adoro ler seus textos.

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  2. Adorei Thiago... Parabéns...

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  3. Gostei do texto, mas gostei ainda mais do NETO MOREIRA, um pseudonimo perfeito!!! Tenho certeza que o AVÔ MOREIRA está feliz com MAIS ESSA homenagem. Eu gosto desse cara bonzinho... te reconheço mais nele! Um grande abraço... ja aguardando o proximo texto, ok.

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    1. É.... ele merece e sempre merecerá toda e qualquer homenagem! A gente deixa a vaidade um pouco de lado para honrar aqueles merecem.... Agora, o bonzinho nunca se foi, nunca.... Tá sempre aqui!

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  4. Muito bom mano!
    Bom reler alguns conhecidos e saber que sempre tem coisa nova...
    Abração e cum Deus!

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  5. Parabéns, Malkaviano, abraços!

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